O churrasco de domingo corria solto. Entre nacos de carne e goles de cerveja, o grupo, quase todo da mesma família, falava das questões de nosso tempo. Como, por exemplo, a da expectativa de vida que não para de aumentar, fazendo com que pais, avós e bisavós cada vez mais convivam com seus descendentes. Foi quando ouvi aquele rapaz dizer ao pai: “Não penses não que vou ficar cuidando de ti, no fim de tua vida, velho.
Afinal, eu não pedi para nascer”.
O jovem falava em tom de brincadeira. Talvez a frase não fosse mais do que uma advertência ao pai para que cuidasse de sua saúde, evitando, assim, uma velhice difícil. De qualquer sorte, aquele “eu não pedi para nascer” revelava uma concepção de vida que merece reflexão.
Pedimos para nascer ?
É correto dizer que não pedimos para nascer? Será mesmo que éramos um nada, sem consciência e sem vontade, antes de ingressarmos nesta fantástica experiência que é a vida na Terra? Nossa consciência, nossa verdadeira individualidade, só começaram a se formar na gestação, ou, como dizem outros, somente após o nascimento, quando nos tornamos “pessoa” no sentido jurídico?
Quem acompanha o desenvolvimento de uma criança talvez comece a supor que não deve ser assim. Bem cedo, bebês exibem traços muito próprios de personalidade. Alguns precocemente revelarão dotes intelectuais e artísticos impossíveis de serem adquiridos ou ordenados no curto período da atual existência. Outros serão um desafio a pais e educadores, por conta de suas más tendências ou pela dificuldade no aprendizado.
Hereditariedade
Não será mais racional trabalharmos com a hipótese de que vivemos, - e, talvez, vivemos muito -, antes de aqui chegarmos? E que a experiência agora em curso resultou de uma programação da qual nós mesmos participamos?
O médico francês Gustavo Geley, autor de importantes obras sobre metapsíquica e reencarnação, nas primeiras décadas do Século XX, já afirmava que a genética jamais explicaria todas as questões relativas à hereditariedade. À medida em que, nos tempos atuais, avançam os estudos em torno dos genes, parece também ir ficando muito claro que há outros fatores mais importantes na formação da personalidade e do comportamento. O best-seller “A Biologia da Crença”, do Dr, Bruce H.Lipton, livro que estou terminando de ler, presenteado que me foi pelo amigo espírita argentino Dante López, sustenta que, bem mais do que a carga genética, o entorno energético e ambiental é decisivo na vida de qualquer ser vivo, das células aos seres mais complexos. No caso da alma humana, as influências energéticas e ambientais estão também radicadas em anteriores experiências vividas em diferentes corpos.
Já vivemos antes ?
De minha parte, eu diria àquele jovem: acho que você pediu para nascer, sim. Quem sabe, até pediu para ter o pai que tem. Sua obrigação de cuidar dele, quando precisar de você não decorre simplesmente de seus laços de sangue, nem dos costumes e das leis que assim determinam. , mas, quiçá, de um compromisso que você próprio assumiu antes de nascer.
Já vivemos antes? Quando essa teoria deixar de ser vista apenas como uma crença religiosa, para se tornar uma hipótese de trabalho da ciência e da filosofia, grandes enigmas da vida humana, com certeza, começarão a ser desvendados.
(Coluna publicada nos jornais "Opinião" do Centro Cultural Espírita de Porto Alegre, e "Abertura" do Instituto Cultural Kardecista de Santos, edições de dezembro 2013).
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