Todos os dias as 11:30 da manhã eu me encaminhava para a grande varanda daquela fazenda e tocava o sino, o sino que convidava a todos para o almoço.
O prazer que eu sentia era muito grande, pois ao tocar aquele sino centenário não era só os patrões, os senhores que eram convidados para o almoço, os meus irmãos de cor também.
Certo que eles não almoçavam juntos dentro da casa grande, mas naquela fazenda a comida que era servida aos senhores era a mesma servida aos escravos que ali nunca foram tratados como escravos.
Os solteiros que viviam avulsos moravam na senzala, que mais parecia um grande alojamento com camas simples, mas todos tinham sua cama, ninguém dormia no chão, os que haviam constituído família moravam em casinhas individuais, ali todos eram tratados como gente com dignidade, embora não tivessem salário, mas não lhes faltava comida, bebida, roupa e o mais importante dignidade, coisa que para aquela época para os que nasciam com a pele negra era em maioria absoluta das vezes negada.
Eu vivia ali, era muito feliz, mas não nasci naquela fazenda, fui vendida quando tinha 14 anos, sai de um verdadeiro inferno, pois que a fazenda que vivia o negro não tinha o menor direito, nem de comer.
Me lembro bem de quando cheguei lá, senti muito medo, mas logo vi que aquela fazenda representava para meus irmãos de cor que lá moravam.
Lá cresci, virei adulta, nunca me envolvi afetivamente com nenhum escravo, eu vivi para meus senhores, ajudei a criar aquelas lindas crianças e sempre fui muito amada por elas, eu era a Babá a Ba como eles me tratavam.
Morri lá já bem velha e sempre recebendo o carinho daquela família.
Tive uma vida muito feliz ali e penso porque não tinham o mesmo tratamento os negros em outras fazendas. Aquela família era constituída de espíritos bons, todos ali pensavam da mesma maneira.
Essa foi a minha penúltima encarnação, e talvez a mais feliz de todas, tenho saudades daquele tempo. E quando ainda hoje, mais de um século do fim da escravidão, vejo pessoas sendo tratadas como verdadeiros escravos, pessoas sofrendo ameaças, outras sendo mortas por guerras religiosas, sinto meu coração doer.
Quanto tempo já passou, e ainda se vê seres humanos com tanto ódio no coração, com tanta amargura.
Eu creio em um mundo melhor para todos. Citei meu exemplo para mostrar que pessoas existem, em todas as épocas, que são verdadeiros anjos para o próximo.
Não descrêem da humanidade, mesmo em meio a tanta maldade podem acreditar anjos encarnados ainda existem.
Tenham fé na humanidade, fé nos seres humanos. Fé em Deus.
Maria, uma escrava feliz.
*Psicografia recebida em 2015 .Médium: Débora S C.