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quinta-feira, 21 de julho de 2016

CONVERSAS FAMILIARES DE ALÉM TÚMULO

       


Segundo o Courrier des États-Unis, vários jornais relataram o fato que a seguir apresentamos, e que nos pareceu fornecer matéria para um estudo interessante:
     “Diz o Courrier des États-Unis que uma família alemã de Baltimore acaba de emocionar-se vivamente com um caso singular de morte aparente. A Sra. Schwabenhaus, há longo tempo enferma, parecia ter exalado o derradeiro suspiro na noite de segunda para terça-feira. 
As pessoas que dela cuidavam puderam observar todos os sintomas da morte: o corpo estava gelado e seus membros tornaram-se rígidos. 
Após ter prestado ao cadáver os últimos deveres, e quando tudo na câmara mortuária estava pronto para o enterro, os assistentes foram repousar. Esgotado de fadiga, o Sr. Schwabenhaus em breve os acompanhou. Estava mergulhado num sono agitado quando, cerca de seis horas da manhã, a voz da esposa feriu-lhe o ouvido. A princípio julgou-se vítima de um sonho; mas o seu nome, repetido várias vezes, não mais lhe deixou qualquer dúvida, precipitando-se de imediato para o quarto da esposa. 
Aquela que era tida por morta estava sentada na cama, parecendo fruir de todas as faculdades e mais forte do que nunca, desde o início da doença.
    “A Sra. Schwabenhaus pediu água e depois desejou tomar chá e vinho. Rogou ao marido que fizesse adormecer a criança que chorava num quarto vizinho. Mas ele estava muito emocionado para isso e correu a despertar as demais pessoas de casa. Sorridente, a doente acolheu os amigos e domésticos que, trêmulos, aproximaram-se de seu leito. Não parecia surpreendida com o aparato funerário que lhe feria o olhar. “Sei que me acreditáveis morta, disse; entretanto, estava apenas adormecida. 
Durante esse tempo minha alma transportou-se para as regiões celestes; um anjo veio buscar-me e em poucos instantes transpusemos o espaço. O anjo que me conduzia era a filhinha que perdemos o ano passado... Oh! Em breve irei reunir-me a ela... Agora, que experimentei as alegrias do Céu, não mais queria viver na Terra. 
Pedi ao anjo para, uma vez mais, vir abraçar meu marido e meus filhos; mas logo retornará para buscar-me.
    “Às oito horas, após se haver despedido com ternura do marido, dos filhos e de uma multidão de pessoas que a rodeavam, dessa vez a Sra. Schwabenhaus expirou realmente, conforme foi constatado pelos médicos, de forma a não deixar subsistir nenhuma dúvida a esse respeito. “Esta cena impressionou profundamente os habitantes de Baltimore.”
    Havendo sido evocado no dia 27 de abril passado, numa sessão da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, o Espírito da Sra. Schwabenhaus manteve a seguinte conversa:

1. Com vistas à nossa instrução, desejaríamos fazer algumas perguntas relacionadas com a vossa morte; consentiríeis em responder-lhas? Resp. – Como não, logo agora que começo a vislumbrar as verdades eternas, e sabedora da necessidade que igualmente sentis de também as conhecer?
2. Lembrais da circunstância particular que precedeu vossa morte?
Resp. – Sim; foi o momento mais feliz da minha existência na Terra.
3. Durante vossa morte aparente, ouvíeis o que se passava à volta e percebíeis os preparativos do funeral?
Resp. – Minha alma estava muita preocupada com a felicidade que se avizinhava.
Observação – Sabe-se, em geral, que os letárgicos vêem e ouvem o que se passa à volta deles, conservando a lembrança ao despertar. O fato a que nos referimos oferece a particularidade de ser o sono letárgico acompanhado de êxtase, circunstância que explica por que foi desviada a atenção da paciente.
4. Tínheis a consciência de não estar morta?
Resp. – Sim; mas isso me era ainda mais penoso.
5. Poderíeis dizer a diferença que fazeis entre o sono natural e o letárgico?
Resp. – O sono natural é o repouso do corpo; o letárgico, a exaltação da alma.
6. Sofríeis durante a letargia?
Resp. – Não.
7. Como se operou vosso retorno à vida?
Resp. – Deus permitiu-me voltar para consolar os corações aflitos que me rodeavam.
8. Desejaríamos uma explicação mais material.
Resp. – O que chamais de perispírito ainda animava o meu invólucro terrestre.
9. Como foi possível não vos terdes surpreendido à vista dos preparativos que faziam para o enterro?
Resp. – Eu sabia que devia morrer; tudo aquilo pouco me importava, desde que havia entrevisto a felicidade dos eleitos.
10. Recobrando a consciência, ficastes satisfeita de retornar à vida?
Resp. – Sim, para consolar.
11. Onde estivestes durante o sono letárgico?
Resp. – Não posso descrever toda a felicidade que experimentava: a linguagem humana é incapaz de exprimir essas coisas.
12. Ainda vos sentíeis na Terra ou no espaço?
Resp. – Nos espaços.
13. Dissestes, quando voltastes a vós, que a filhinha que havíeis perdido no ano anterior vos tinha vindo buscar. É verdade?
Resp. – Sim; é um Espírito puro.
Observação – Nas respostas dessa mãe, tudo anuncia tratar-se de um Espírito elevado; nada há, pois, de espantoso que um Espírito mais elevado ainda se tivesse unido ao seu por simpatia. Entretanto, não devemos tomar ao pé da letra a qualificação de Espírito puro, que por vezes os Espíritos se dão entre si. Por essa expressão devemos entender os Espíritos de uma ordem mais elevada que, achando-se completamente desmaterializados e purificados, não mais estão sujeitos à reencarnação: são os anjos que desfrutam a vida eterna. Ora, aqueles que não atingiram um grau suficiente não compreendem ainda esse estado supremo; podem, pois, empregar o termo Espírito puro para designar uma superioridade relativa, mas não absoluta. Disso temos numerosos exemplos, querendo parecer-nos que a Sra. Schwabenhaus encontrasse neste caso. 
Algumas vezes os Espíritos zombeteiros também se atribuem a qualidade de Espíritos puros, a fim de inspirarem mais confiança àqueles a quem desejam enganar, e que não têm suficiente perspicácia para os julgarem por sua linguagem, pela qual sempre se traem em razão de sua inferioridade.
14. Que idade tinha essa criança quando morreu?
Resp. – Sete anos.
15. Como a reconhecestes?
Resp. – Os Espíritos superiores se reconhecem mais depressa.
16. Vós a reconhecestes sob uma forma qualquer?
Resp. – Somente a vi como Espírito.
17. O que ela vos dizia?
Resp. – “Vem; segue-me em direção ao Eterno.”
18. Vistes outros Espíritos, além do de vossa filha?
Resp. – Vi uma porção de outros Espíritos, mas a voz de minha filha e a felicidade que pressentia eram minhas únicas preocupações.
19. Por ocasião de vosso retorno à vida, dissestes que em breve iríeis reencontrar a filha; tínheis, pois, consciência de vossa morte próxima?
Resp. – Para mim era uma esperança feliz.
20. Como o sabíeis?
Resp. – Quem não sabe que é preciso morrer? Minha doença mo dizia bem.
21. Qual era a causa de vossa enfermidade?
Resp. – Os desgostos.
22. Que idade tínheis?
Resp. – Quarenta e oito anos.
23. Deixando a vida definitivamente, tivestes de imediato consciência clara e lúcida da nova situação?
Resp. – Tive-a no momento da letargia.
24. Experimentastes a perturbação que acompanha ordinariamente o retorno à vida espírita?
Resp. – Não; estava deslumbrada, mas não perturbada.
Observação – Sabe-se que a perturbação que se segue à morte é tanto menor e menos duradoura quanto mais se depurou o Espírito durante a vida. O êxtase que precedeu a morte dessa mulher era, aliás, um primeiro desprendimento da alma de seus laços terrenos.
25. Desde que estais morta já revistes vossa filha?
Resp. – Freqüentemente estou com ela.
26. A ela estais reunida por toda a eternidade?
Resp. – Não. Sei, porém, que depois de minhas últimas encarnações estarei no paraíso, onde habitam os Espíritos puros.
27. Então vossas provas não terminaram?
Resp. – Não, mas, doravante, serão mais felizes. Não me deixam senão esperar e a esperança já é quase a felicidade.
28. Vossa filha tinha vivido em outros corpos antes daquele pelo qual foi vossa filha?
Resp. – Sim; em muitos outros.
29. Sob que forma vos encontrais entre nós?
Resp. – Sob minha derradeira forma de mulher.
30. Percebei-nos tão distintamente como o faríeis quando viva?
Resp. – Sim.
31. Desde que estais aqui sob a forma que tínheis na Terra, é pelos olhos que nos vedes?
Resp. – Claro que não, o Espírito não tem olhos.
Encontro-me sob minha última forma tão-somente para satisfazer às leis que regem os Espíritos, quando evocados e obrigados a retomar aquilo a que chamais perispírito.
32. Podeis ler os nossos pensamentos?
Resp. – Sim, posso; lerei caso eles sejam bons.
Agradecemos as explicações que houvestes por bem nos dar; pela sabedoria das vossas respostas reconhecemos que sois um
Espírito elevado e esperamos que possais fruir a felicidade que mereceis.
Resp. – Sinto-me feliz em contribuir para vossa obra;
morrer é uma alegria, quando podemos auxiliar o progresso, como o faço agora.

*Revista Espírita. Setembro de 1858. Allan Kardec.




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